O texo abaixo, escrito às 4 da manhã, certamente renderia uma nota 5
“Fazer parte de uma banda internacionalmente conhecida me fez entrar num mundo que, até então, eu desconhecia. Quando a gente tem uma banda, acredita nela, luta por ela, muitas vezes não sabe o que se passa por trás dos palcos, ou da produção de um disco, ou o quão trabalhoso é manter uma banda de sucesso funcionando. Era assim com o Karma. Nós éramos, em 2000, uma banda com um disco (Inside the Eyes) lançado por uma gravadora pequena, com pouca verba, mas com excelentes músicos e muita vontade de acontecer. É claro, isso não era o bastante.
Como muita gente já sabe, no início de 2001 fui chamado para entrar no Angra. Na época, o lado sonhador prevalecia sobre o lado profissional, e a possibilidade de que o Angra atrapalhasse o Karma me fez refletir muito, já que eu era fã da minha própria banda. No entanto, é claro que eu aceitei o convite, o que foi uma decisão mais do que acertada. Na primeira reunião que tive com a banda, já então completa novamente após a separação de
Hoje em dia, depois de alguma água passada embaixo da ponte, eu considero que aprendi um pouco, uma parte ínfima do universo complexo de gravadoras, editoras, distribuidoras, empresários, viagens, licenças, contratos, porcentagens, direitos, taxas e impostos inerentes à vida de músico. A cada dia que passa eu aprendo alguma coisa nova. E, por mais que meus colegas mais experientes de banda tenham tido muita paciência pra me explicar o máximo que conseguiram, muitas coisas ainda ficaram incertas em minha cabeça. O que aprendi, de fato, foi na raça, errando e acertando (mais errando que acertando).
A lição mais importante que eu tirei de tudo isso é que não basta ser o melhor baixista do mundo se você não sabe gerir sua carreira. Por isso, em minhas aulas e workshops, procuro dedicar um tempo conversando com os alunos, pra que eles possam ir se preparando para o mercado, e se libertando dos mitos que rondam a profissão de músico. A minha dica inicial seria “leia o jornal” (que hoje em dia pode facilmente ser feito gratuitamente no computador se você acesso à internet), informe-se sobre os acontecimentos à sua volta. Aprenda a calcular juros e porcentagens, familiarize-se com planilhas de custos e receitas, aprenda a aplicar seu dinheiro, organize sua vida financeira (mesmo que você nem tenha renda fixa ainda), e você estará mais preparado para enfrentar o mercado do que eu estava em 2001.
Tudo isso parece muito frio e calculista por estarmos falando de uma arte tão intuitiva e bela como a música, mas infelizmente é necessário. Quanto mais profissional você se mostrar mesmo nas situações mais simples, mais chances terá de liderar em vez de ser liderado, e menos riscos correrá de ser passado para trás. Nunca assine um contrato sem antes levá-lo a um advogado competente, preferencialmente especialista no assunto. Nunca!!! Faça registros de quaisquer receitas ou gastos que tiver com sua banda, desde o xérox da capinha da demo até o correio pra enviar um CD. Mais tarde, isso fará uma enorme diferença, acredite.
Outro aspecto de suma importância numa banda é a comunicação. Onde a comunicação é falha, problemas surgirão. A clareza de idéias e ações deve ser a tônica das relações de uma banda. Nada como a franqueza para resolver as situações antes que elas se tornem insolúveis. Se você não gosta de alguma coisa, fale. De outro lado, saiba escutar o que os outros têm a dizer. Não tente ganhar as disputas internas no “grito”, procure o dialogo franco e aberto. Como reza a velha máxima, “uma banda é como uma família”. Se tudo der certo, você vai acabar vendo seus companheiros de banda muito mais do que sua própria família, namorada(o), amigos, etc. Qualquer semente de discórdia não resolvida hoje virá à tona no futuro, isso é certo como 2+2=4.
Hoje, estou aplicando todos os conceitos que aprendi ao longos desses 5 anos no Karma, a banda que deixei em 2001, e da qual agora faço parte novamente. Sinto-me muito mais maduro e capaz de liderar uma banda, e isso está começando a gerar frutos. Estou de volta à situação em que me encontrava antes entrar para o Angra, mas as minhas perspectivas são muito maiores, e um dos fatores de maior importância nesse sentido é saber conviver com as pessoas. As amizades e contatos que eu fiz com o Angra são os mesmos que estão ajudando o Karma agora. Ser uma pessoa agradável é o maior trunfo que você pode ter na mãos, pois nunca faltarão pessoas para te ajudar.
Em resumo, não se iluda. Não largue o emprego ou a faculdade se as coisas ainda não estão de fato acontecendo. Não acredite em nenhuma promessa de nenhum tipo até ver os resultados concretos aparecerem. Não dê dinheiro a ninguém que não conheça. Não é porque alguém se diz empregado da Sony, e que vai te lançar mundialmente, que você vai largar tudo. Existem muitas pessoas mal-intencionadas por aí. Seja desconfiado, sem ser chato. Já cansei de ver amigos meus largarem tudo por uma promessa vazia, e depois terem de vender seus próprios instrumentos pra cobrir os prejuízos e o calote que tomaram. Eu vejo isso todos os dias. E ao mesmo tempo, não me sinto no direito de acabar com os sonhos das pessoas, porque eu sei como é sonhar. Ao mesmo tempo, agarre todas as oportunidades, e dê sempre o seu melhor. Um dia você poderá descobrir que ser músico não se limita a ter uma banda com músicas próprias, e que existem inúmeras alternativas. Seja o melhor que puder, seja versátil, seja profissional, tenha sua mente aberta e você terá muito a oferecer para o mercado.”